Depois da descoberta da estrutura da molécula de ADN, em forma de dupla hélice, em 1953, durante mais de três décadas os cientistas pensaram que o património genético dos seres vivos só codificava 20 aminoácidos. Mas, em 1986, os cientistas anunciaram a descoberta do 21º aminoácido - a selenocisteína.
Agora, duas equipas de cientistas da Universidade Estadual do Ohio, nos Estados Unidos, anunciam, em dois artigos científicos diferentes, a descoberta do 22º aminoácido. Chama-se pirrolisina e é codificado pelo material genético de um micro-organismo chamado "Methanosarcina barkeri". Não é uma bactéria, mas é parecido com uma bactéria sem um núcleo onde está resguardado o ADN: pertence a um domínio de classificação dos seres vivos identificado há relativamente pouco tempo, o dos arqueões.
Estes micro-organismos têm características algo exóticas, com uma preferência por ambientes extremos. O "Methanosarcina barkeri", por exemplo, prefere metano a oxigénio. Onovo aminoácido faz parte de uma enzima (proteína que aumenta a velocidade de uma reacção bioquímica) que é usada para processar o gás metano.
O novo aminoácido acabou por ser descoberto na sequência de um trabalho sobre bioquímica básica. Os cientistas procuravam compreender como é que determinados micro-organismos - os metanogenos - conseguem converter os compostos que contêm metil em metano. Conhecem há muito tempo os mecanismos bioquímicos que convertem o dióxido de carbono e o acetato em metano. Não compreendem, porém, como é que uma classe de compostos comuns - as metilaminas - são transformadas em metano.
Há vários anos que a equipa de Joseph Krzycki estuda o "Methanosarcina barkeri": primeiro, identificaram-se as proteínas que convertem os compostos de metil em metano e, depois, um dos genes responsáveis pela sua produção. Estudando esse gene, viram que algumas das suas letras formavam uma sequência estranha, que, afinal, dava instruções para o fabrico de um novo aminoácido. Mais tarde, a equipa de Michael Chan descobriu como é a estrutura desse aminoácido.
O 22º aminoácido deve ser muito raro. Pelo menos é o que pensa Joseph Krzycki, por ter demorado tanto tempo a identificar. No entanto, o mesmo cientista considera provável a sua existência noutros organismos, além dos metanogenos. "Esta descoberta mostra que o código genético, e por isso a evolução, apresenta maior diversidade do que poderíamos pensar", afirma Joseph Krzycki, citado num comunicado da sua universidade.
A mesma opinião é partilhada por John F. Atkins e Ray Gesteland, do Departamento de Genética Humana da Universidade do Utah, nos Estados Unidos, num comentário também publicado na "Science". Consideram que a descoberta reflecte a grande riqueza do código genético.
À medida que os cientistas aperfeiçoam as técnicas de sequenciação dos genomas, há quem diga que talvez as proteínas tenham mais blocos fundamentais e, por isso, a vida tenha maior diversidade. O 23º aminoácido poderá estar só à espera de ser descoberto pelos cientistas. "Com tantos investigadores a dissecar tantos genomas, é razoável sugerir que pode haver mais à espera de serem descobertos. Este trabalho pode levar outros cientistas a olhar de novo para as sequências genéticas que, à primeira vista, lhes pareceram aberrantes. Elas podem significar descobertas como a nossa", diz Michael Chan.
Pesquisado por Ronildo de Sousa Lima
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